Ton Toy e Bluesvi Santos falam sobre a série Um Mestre dos Sons de Sergipe, que terá exibição gratuita em Aracaju
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Por Díjna Torres

No próximo dia 25 de novembro, o público de Aracaju terá a oportunidade de assistir, gratuitamente, a partir das 19h, no Centro de Criatividade, à exibição de episódios da série documental Ton Toy: Um Mestre dos Sons de Sergipe. O evento contará com a presença do diretor Bluesvi Santos e do percussionista homenageado Ton Toy, figura central da produção. A série mergulha na trajetória de um dos mais importantes nomes da música e da cultura popular sergipana, revelando suas conexões com mestres, mestras e grupos tradicionais que mantêm viva a força dos ritmos e das ancestralidades do estado.
O Periféricos conversou com Ton Toy e Bluesvi Santos sobre o processo de criação da série, os desafios da produção, o papel da arte como educação e resistência, e a importância de ver Sergipe retratado com o protagonismo que merece.
Periféricos: Ton Toy, como foi para você ver sua trajetória transformada em série documental?
Ton Toy: Ver a minha arte e meus trabalhos se transformarem em um documentário fortalece o sentimento de importância que eu tenho nesse processo histórico e cultural de Sergipe e, principalmente, de Aracaju, onde nasci. Sou de um bairro riquíssimo em cultura, e poder entregar algo que mostre isso, que fique registrado para as próximas gerações, é muito simbólico. A série mostra o quanto é fundamental trabalharmos com arte, com formações, com coletivos. Ela me permite revisitar um pedaço da minha estrada, entender cada etapa e sentir que tudo se conecta. Fico muito feliz em poder deixar isso registrado, como parte de um legado coletivo que a arte constrói todos os dias.
Periféricos: A série mostra muito da sua vivência com a percussão e com a cultura popular. Qual a importância da ancestralidade na sua arte?
Ton Toy: Desde sempre a arte esteve presente na minha vida de forma natural. Nunca foi uma busca por sucesso, mas por estar junto de pessoas que também sentem e respeitam a arte. Eu acredito que trilhei esse caminho pela cultura popular e pela coletividade. A ancestralidade me guia — é ela que protege e firma meu caminho. Tive várias oportunidades de sair de Sergipe, mas algo sempre me manteve aqui, e eu respeito muito isso. Sinto essa espiritualidade como uma força que me guia e me faz continuar, fazendo da minha arte uma forma de conexão e transformação, tanto minha quanto das pessoas ao meu redor.
Periféricos: Você se vê como um formador de gerações? Como é esse papel na sua vida?
Ton Toy: Com certeza. Desde 2002, quando comecei a dar aulas de percussão para crianças e adolescentes, entendi o poder da arte como ferramenta de educação e transformação.
Percebi que a percussão podia alcançar o ser humano e despertar consciência. A partir daí, nunca mais parei. Fui estudar mais sobre os direitos da criança e do adolescente e unir isso à arte, criando oficinas com materiais recicláveis e acessíveis. Assim nasceu o projeto Lateros Curupira, que já formou muita gente. Hoje vejo pelas ruas adultos que me chamam de “professor” e lembro do quanto a arte foi capaz de transformar suas realidades. Ser formador é isso: ajudar o outro a crescer, a se entender como cidadão, usando a arte como fonte de estudo, inspiração e mudança.
Periféricos: Qual episódio te emocionou mais ou te surpreendeu durante as gravações?
Ton Toy: Ainda não vi todo o documentário pronto, mas lembro das gravações com muito carinho. Cada dia foi uma emoção diferente. A equipe se entregava de corpo e alma — sol quente, longas jornadas, mas sempre com alegria e sentimento de missão cumprida. Um dos momentos mais marcantes foi o encontro com o grupo do samba de aboio. Eu não conhecia de perto e poder tocar junto com o mestre foi emocionante. Também foi muito especial reencontrar grupos como o América e o Folclore Andino, que marcaram a minha trajetória. Cada reencontro foi uma viagem no tempo, uma celebração da arte coletiva.
Periféricos: Que mensagem você gostaria que o público levasse após assistir à série?
Ton Toy: Quero que o público perceba o quanto a arte sergipana é rica e fundamental. Tivemos grupos como Grupo América, Bolo de Feira e Sulanca, que contribuíram profundamente para a construção musical de Sergipe, mas que muitas vezes ficam esquecidos.A arte precisa ser vista como legado, como construção. Espero que quem assista à série sinta isso — que veja em mim e nos grupos retratados a força da percussão e da cultura sergipana. A série mostra só um pedaço desse universo, mas já é um registro importante para que não percamos nossas raízes e continuemos crescendo com emoção e identidade.

Periféricos: Bluesvi Santos, como surgiu a ideia de documentar a vida de Ton Toy?
Bluesvi; O projeto nasceu em 2015, ainda dentro de uma proposta de mestrado sobre cultura popular e comunicação. A ideia inicial não era documentar a vida de Ton Toy, mas com o tempo, e com a aproximação com ele, percebi a grandeza do artista e do educador que ele é. Quis unir o útil ao agradável: registrar os grupos e manifestações tradicionais de Sergipe através do olhar e da vivência de um jovem mestre, um “fazedor de cultura”. Assim nasceu Um Mestre dos Sons de Sergipe, um retrato sensível e respeitoso da arte de Ton Toy e de toda a resistência cultural que ele representa.
Periféricos: Quais foram os principais desafios da produção?
Bluesvi; Foram muitos. O maior talvez tenha sido adaptar as ideias a um orçamento menor do que o ideal para um projeto desse porte. Felizmente, tivemos o apoio do Edital FUNCAP-SE nº 06/2023 – Tarcísio Duarte – Apoio à Produção Audiovisual (Lei Paulo Gustavo), que foi essencial para tornar o projeto realidade. Mesmo com as limitações, buscamos sempre trabalhar com responsabilidade e respeito pelos recursos públicos. Foi um processo intenso, de muito aprendizado, e que me fez perceber o real impacto que uma obra audiovisual pode ter quando é feita com propósito e compromisso com a cultura.
Como foi trabalhar com uma figura tão simbólica da música sergipana como Ton Toy?
Bluesvi; Um privilégio imenso. Conheço Ton Toy desde os meus 12 anos — hoje tenho 37 — e ele sempre foi uma inspiração. É um artista gigante, com um coração generoso e uma trajetória marcada pela entrega à comunidade. Durante as gravações, vimos o quanto ele é querido e respeitado. As pessoas falavam sobre ele com emoção verdadeira. Ton Toy representa a força da arte negra, periférica e educadora de Sergipe. Para mim, é uma honra contar parte da história dele e transformá-la em um registro que o mundo possa ver.

Periféricos: A série será exibida no Chile em dezembro. Quais são as expectativas para as exibições internacional e local?
Bluesvi; As expectativas são as melhores possíveis. Teremos o apoio da capital regional de Atacama e reuniões com dois ministérios do governo chileno interessados em participar. Levar Sergipe para fora do país é um sonho — especialmente levando uma parte tão significativa da nossa cultura negra e popular. Mas exibir a série em Aracaju, minha cidade, tem um significado especial. Venho de uma realidade difícil e, poder retornar com uma obra desse tamanho, é um sentimento indescritível. Espero que o público veja o valor da nossa cultura e que a série inspire novas produções.
Você acredita que a obra pode abrir mais portas para o audiovisual sergipano?
Bluesvi; Sem dúvida. Essa série já está abrindo caminhos. Recebemos convite do Chile para exibir o documentário em escolas e espaços culturais, como forma de aproximar os estudantes da música e do cinema documental brasileiro. Isso mostra a força que temos e o potencial do audiovisual sergipano para ganhar o mundo. Acredito que essa é apenas a primeira de muitas produções que farão Sergipe ser visto do tamanho que realmente é: um gigante da cultura popular.

Por: Díjina Torres
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