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DO AGRESTE À GALERIA ÁLVARO SANTOS

Atualizado: 23 de out.

Calunga, o menino que transforma seus olhares em arte e faz da negritude periférica potência criativa


(Foto: Janisse Bispo)
(Foto: Janisse Bispo)

Por trás do codinome Calunga, existe um jovem artista plástico, Davi Silva, que transformou suas vivências periféricas e a descoberta da própria identidade em uma potente linguagem visual. Natural de Aracaju, mas criado na zona rural da cidade de Areia Branca, no agreste sergipano, Calunga carrega em seu olhar introspectivo e no gesto delicado de quem sempre foi mais ouvinte do que falante, uma força criativa que hoje conquista espaço nas paredes de uma das principais galerias de arte do estado.


Hoje, com orgulho e emoção, o artista celebra sua participação no Salão dos Novos, uma das mais importantes mostras de artes plásticas de Sergipe. A exposição, sediada na Galeria de Arte Álvaro Santos (GAAS), no centro de Aracaju, existe desde 1984 com o objetivo de revelar talentos locais. E agora, Calunga é um deles. Sua presença nesse espaço é um marco não apenas pessoal, mas simbólico, pois representa um corpo negro, vindo da periferia, que rompe barreiras e expõe sua verdade em telas que dialogam com cidade.


Nada passa despercebido pelo olhar de Calunga, e cada memória fica armazenada para ser uma tela em algum momento de criação. (Fotos Janisse Bispo)


A infância do artista plástico foi de chão batido, conversas de varanda e histórias que enchiam a casa e a mente. "Foi uma infância feliz", relembra. Esse universo de cores, cheiros e experiências cotidianas se transformou, aos poucos, na base de sua sensibilidade artística. Desde pequeno, se entendia como alguém "de dentro" mais atento às entrelinhas do que ao que estava à vista.


A exposição é repleta de homenagens e lembranças do artista. Contempla momentos e pessoas que marcaram sua vida. (Fotos: Janisse Bispo)


Na adolescência, enfrentou as turbulências típicas de quem passa por muitas mudanças de escola e a cada nova sala, um recomeço. Isso o fez mergulhar ainda mais em si mesmo. E foi nesse silêncio que a arte surgiu. A primeira faísca veio de forma despretensiosa ao tentar copiar um adesivo do Mickey Mouse, surpreendeu-se com o resultado. Logo depois, em um evento escolar, seus retratos de figuras da música chamaram atenção. E assim, com lápis na mão e elogios na memória, decidiu seguir o caminho da arte. Fez o ENEM, passou para o curso de Design Gráfico e nunca mais parou de criar.


Mas foi uma pergunta aparentemente simples do pai que virou chave: "Você já ouviu falar sobre o Dia da Consciência Negra?" A partir daí, começou um mergulho profundo em sua identidade como jovem negro periférico. Estudar a história do povo negro, conhecer movimentos sociais, ler autores e autoras negras, explorar a arte urbana, tudo isso se tornou não só inspiração, mas combustível.


O grafite, o hip hop, os coletivos periféricos e as rodas de conversa se tornaram espaços de acolhimento, como se dissessem: você pertence a este lugar. E foi se apropriando desse pertencimento que Calunga encontrou sua voz e lugar de fala. Sua arte passou a abordar temas como racismo estrutural, masculinidade negra, territorialidade, cultura periférica e ancestralidade. Cada pincelada é  denúncia, afeto, mas também construção de memória.


Seus quadros retratam desconhecidos, amigos, familiares, referências de luta e afeto. Suas obras são manifestações de vida e resistência. Calunga pinta porque precisa. Pinta porque é urgente. E porque sua arte é “Movimento de levar a cultura para todos, é um momento de lavar a alma ferida desse corpo negro”, afirma o artista plástico.



A catraca representa o ponto de entrada para a exposição. (Fotos: Janisse Bispo)
A catraca representa o ponto de entrada para a exposição. (Fotos: Janisse Bispo)

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Por Janisse Bispo e Viviane Silva

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