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Avanços e desafios dentro do afroempreendorismo feminino

Histórias como a da costureira Amanda Marley, revelam potência criativa diante de desafios enfrentados por empreendedoras negras


Amanda faz das suas ecobags peças únicas para suas clientes. (Foto: arquivo pessoal)
Amanda faz das suas ecobags peças únicas para suas clientes. (Foto: arquivo pessoal)

Com 26 anos, olhar firme e uma presença que ocupa espaços com naturalidade, Amanda não passa despercebida. Mulher preta, periférica e empreendedora, ela encontrou na moda sustentável uma forma de se expressar, gerar renda e, principalmente, inspirar. Entre estampas personalizadas cheias de identidade, ela busca um futuro possível para si e para outras mulheres pretas.


Moradora do bairro Getúlio Vargas, zona leste de Aracaju, ela trabalhou em áreas diversas até se tornar empreendedora. Foi em uma dessas experiências que a jovem percebeu que se pudesse vender nas lojas em que já trabalhou, poderia vender para si mesmo de forma regular e gerar uma renda de forma independente. Diante de um período ruim, alta jornada de trabalho, tomou uma decisão, e a partir daquele momento queria empreender e para não demorar a descobrir no que iria trabalhar, com determinação buscou fazer cursos de costureira para aprimorar suas habilidades e assim nasceu a “Amarley”, sua marca de ecobags.


A “Amarley” surgiu a partir de uma visão ampla que foi observada na área de vestuário quando a empreendedora fazia cursos de costura. Diante de diversas possibilidades, as ecobags personalizadas foram escolhidas para ser o pontapé desse projeto. “As bolsas são totalmente personalizadas, bolsas únicas. Cada pessoa terá sua bolsa e não existe essa de você fazer uma bolsa para você visualizar outra pessoa usando a mesma bolsa. O conceito não vai ser esse, até porque cada pessoa é única, então, cada pessoa merece um diferencial”, Explica Amanda.


As ecobags é o foco da marca “Amarley”, porém a costureira costuma explorar sua criatividade produzindo alguns acessórios. (Foto: arquivo pessoal)
As ecobags é o foco da marca “Amarley”, porém a costureira costuma explorar sua criatividade produzindo alguns acessórios. (Foto: arquivo pessoal)

O negócio e a sustentabilidade


A marca de ecobags começou pequena, no início de 2025, com poucos modelos e uma produção quase toda feita à mão. E mesmo com poucos meses de marca,  ela percebeu o potencial real da ideia. Escolheu o Instagram como sua principal vitrine, não apenas por ser gratuito e acessível, mas por enxergar ali uma ferramenta poderosa para atrair clientes, mostrar o processo criativo e, principalmente, vender. 


Empreender para si mesmo trouxe uma liberdade que a costureira nunca tinha experimentado antes. A autonomia de decidir os próprios horários, criar de acordo com seus valores e ver o resultado do seu esforço se transformar em reconhecimento e renda foi transformadora. E mais do que isso: passou a entender que construir algo do zero, com propósito, podia ser muito mais recompensador do que qualquer rotina tradicional de trabalho.


“É libertador saber fazer várias coisas, mas você saber fazer algo para você e fazer com que tudo isso vire uma renda fixa é maravilhoso. Vou fazer vários cursos de empreendedorismo, porque o que eu sei ainda é pouco para o que está por vir”, conta. Mais do que um negócio, o trabalho de Amanda se tornou ferramenta de transformação. “ É algo revolucionário, e o mais enriquecedor é você ver que existem várias pessoas que estão trabalhando e produzindo para si mesmo com coisas que gostam. A partir do momento que você trabalha com o que gosta a vida fica mais leve”, pontua.


A sustentabilidade é o pilar central da criação das ecobags da jovem Amanda Marley. Desde o início do empreendimento, ela apostou no reaproveitamento de tecidos descartados pela indústria têxtil, garimpando sobras de rolos, retalhos e peças em desuso para transformar suas bolsas em únicas. Uma de suas apostas mais conscientes são as ecobags feitas com algodão cru, material que não passa por processos químicos pesados, reduzindo o impacto ambiental. Para Amanda, a moda sustentável vai além da estética. “É sobre repensar o consumo, valorizar a natureza e também cuidar das nossas escolhas. Não faz sentido falar de futuro sem cuidar do agora”, defende.


“É sobre repensar o consumo, valorizar a natureza e também cuidar das nossas escolhas. Não faz sentido falar de futuro sem cuidar do agora”. (Foto: arquivo pessoal)


Desafios e Expectativas


Como toda empreendedora, Amanda enfrenta um obstáculo que é a limitação de recursos. A ausência de acesso facilitado a crédito, os custos com matéria-prima sustentável e a dificuldade de formalização do negócio são apenas alguns dos desafios cotidianos. “É desafiador começar do zero, sem renda e criar algo”. Apesar disso, se mantém otimista e destaca novas possibilidades que ainda deseja explorar: “Quero melhorar minha estrutura, investir em máquinas melhores, ter um ateliê com cara de loja, com espaço para oficinas e trocas com outras mulheres. É difícil, mas é possível”, diz.


Empreender sozinha, sem uma equipe de apoio ou uma rede consolidada, exige dela não apenas múltiplas habilidades, mas também resiliência. “Eu busco sempre conhecimento, busco cursos para aperfeiçoar meu trabalho, e isso é muito importante, APRENDER. E quando a gente tem um propósito, a gente encontra forças até onde nem sabia que tinha”, reflete.


Segundo o  “Elas Empreendem”,   panorama  sobre o empreendedorismo feminino no Brasil feito pelo Governo Federal, em parceria com o  Ministério do Desenvolvimento, Indústria, Comércio e Serviços (MDIC) e o Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (PNUD), foi criado  o Ministério do Empreendedorismo, da Microempresa e da Empresa de Pequeno Porte (MEMP), com o decreto de nº 11.994/2024, com a finalidade de implementar políticas públicas para pequenos empreendedores com atenção às mulheres.


Ainda segundo os dados do panorama, as mulheres representam 33,9% dos empreendedores brasileiros. Entretanto, enfrentam desafios significativos: cerca de 65% dos negócios liderados por mulheres operam na informalidade, e apenas 25% dos recursos destinados a pequenos negócios são acessados por elas. A disparidade de renda é outro obstáculo notável. A diferença de renda entre um empreendedor branco do sexo masculino e uma empreendedora negra é, em média, superior a 60%.


Além dos desafios relacionados à renda, as empreendedoras negras enfrentam  desafios adicionais. Um estudo realizado pelo Sebrae e FGV em 2021 revelou que o número de empresárias negras que tiveram empréstimos negados é 50% superior em relação às empreendedoras brancas. Além disso, 71% das mulheres negras empreendedoras não possuem empregados com carteira assinada (CLT), o que evidencia a dificuldade de expansão de seus negócios.


Olhar para o futuro


A empreendedora vislumbra crescimento profissional através de suas produções. “ Me vejo grandona, fazendo minhas criações e abrir meu leque de conhecimentos”. Ela também quer expandir sua marca para além das redes sociais, participando de feiras sustentáveis, colaborando com outros artistas e, quem sabe, levando sua moda para vitrines fora do estado. Mas, acima de tudo, deseja que sua trajetória seja inspiração para que outras mulheres também possam sonhar e realizar.


O caminho de Amanda é um mundo onde a moda respeite o meio ambiente, valorize a identidade de quem cria e acolha quem consome de forma consciente. E mesmo sabendo que o caminho ainda é longo, a jovem empreendedora segue firme, com a certeza de que está no rumo certo. “Tem dias difíceis, mas tem dias em que eu olho pra tudo isso e penso: é só o começo. E é bonito demais começar algo que pode ser maior do que a gente imagina. Eu sou só o começo. Quero ser ponte, não o final do caminho”, relata Amanda, com a certeza de que sua caminhada está apenas começando.


Mesmo diante de tantas barreiras, mulheres como Amanda seguem provando que é possível empreender com propósito, identidade e consciência. Os desafios ainda são muitos, mas as transformações também estão em curso. Políticas públicas, iniciativas coletivas e o fortalecimento de redes de apoio têm pavimentado novos caminhos. E esses caminhos têm cor, têm gênero, têm voz. Que cada vez mais, empreender seja também um ato de liberdade.


Entre desafios, Amanda sempre busca estudar e aprender sobre o mercado. (Foto: arquivo pessoal)
Entre desafios, Amanda sempre busca estudar e aprender sobre o mercado. (Foto: arquivo pessoal)

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Por Janisse Bispo

Supervisão: Viviane Silva

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